Foto: Sede da Defensoria Pública da União em Brasília
Ednalva Maria Miranda de Oliveira (foto abaixo) vivia dias de profunda angústia e incerteza. Mãe da pequena Namar Miranda (foto abaixo), de pouco mais de um ano, tinha pouco para oferecer para saciar a fome da filha. Naquela época, meados de 2016/2017, Ednalda lutava sozinha para criar a menina, que corria sérios riscos de morrer. Teve de abandonar o trabalho por causa das constantes visitas aos médicos na esperança de salvar a vida da filha.
“Eu mesma pesava quase
trinta quilos, mas tinha que manter a esperança. A menina chorava dia e noite,
e todo mundo dizia, nas consultas a que eu ia, que ela não teria salvação”,
lembra Ednalva, chorando durante a entrevista ao recordar os dias de
dificuldade. Ela procurou as instituições de assistência social, mas elas pouco
ajudaram. Até que um dia, quando voltava para casa após mais um périplo
hospitalar, encontrou uma vizinha, que lhe disse: “minha filha, por que você
não procura a Defensoria Pública?”.
Aquele conselho mudou a vida
de quem só recebia R$ 280 por mês e, em muitos dias, não tinha sequer cuscuz
seco para dar para a filha. “Eu ia no hospital todo santo dia, até que me
disseram que, se eu não fizesse nada, minha filha ia morrer”. Ela juntou todos
os relatórios médicos e levou à sede da Defensoria Pública da União (DPU) em
Brasília.
“Foi Deus quem colocou os anjos da Defensoria na minha vida”, afirma, emocionada. A DPU conseguiu que ela passasse a receber o Benefício de Proteção Continuada (BPC). Além de poder dar de comer para a filha, o BPC também permitiu que Ednalva pagasse os aluguéis atrasados da casa onde morava. “A minha sorte foi que o moço que alugava a casa entendeu minha situação. Mas ele não tinha culpa dos meus problemas. Hoje, sete anos depois, posso dizer que só quem teve compaixão por mim foi o pessoal da Defensoria”.
Cuidador da mãe
Marcelo Rodrigues Moura (foto abaixo), de
48 anos, passou boa parte de sua vida cuidando da mãe doente. Ela faleceu em
2004, e Marcelo prosseguiu sua vida profissional, atuando principalmente na
área de gastronomia. Até que descobriu que estava com câncer, e o esforço
profissional de ficar em pé durante muito tempo começou a lhe trazer mais dor
do que satisfação.
“Procurei a Defensoria para ver se consigo minha aposentadoria por invalidez.
Ainda não deu certo, mas não é culpa deles. Aliás, só tenho a agradecer o
atendimento que recebo toda vez que eu vou lá”, explicou. Apesar das dificuldades,
Marcelo elogia o trabalho da Defensoria. Ele sabe que várias pessoas também
atendidas pela instituição estão na mesma situação e têm pressa. E
legitimamente têm dificuldades para entender e aceitar as burocracias e
obstáculos para obter o que precisam.
“Os atendentes da Defensoria
me explicam tudo, de maneira muito clara. Quem está lá, que depende do serviço
público, já passou antes por muitas pessoas, por muitos atendimentos. E nem
sempre fomos bem atendidos. Mas da Defensoria eu não posso reclamar”.
Ciclos
de envolvimento
Cristiane Torres (foto abaixo) é atendente
da Defensoria Pública da União no Distrito Federal. Cabe a servidores como ela
atuar como a porta de entrada dos assistidos na Defensoria. São eles que
prestam o primeiro atendimento, escutam a demanda, conferem se a documentação
está correta para o prosseguimento do processo e, com base nessa análise
preliminar, abrem um procedimento administrativo efetivo, que pode gerar um
processo judicial.
E por que esse trabalho é
tão importante? Porque, à exceção dos processos nos quais ocorre audiência
judicial, nem sempre os assistidos têm contato direto com os defensores, cujas
atribuições são exercidas em muitos locais: no judiciário, em audiências
públicas, em reuniões etc. A primeira face da Defensoria, para a maior parte
dos assistidos, é a dos atendentes, que atuam por turnos, trabalhando das 8h às
18h, além da Defensora ou Defensor plantonista, ao menos um profissional todos
os dias. No dia anterior à entrevista, Cristina disse que passaram pela DPU em
Brasília 86 pessoas, o que daria uma média de quase nove atendimentos por hora.
Mais do que fisicamente, a grande questão para os atendentes é o embate psicológico e emocional de conviver diariamente – e diretamente – com o sofrimento de pessoas em situação de vulnerabilidade e desamparo. Cristiane conviveu diretamente com esse carrossel de emoções quando chegou à Defensoria. “Eu sempre gostei muito do que eu faço. Mas, no início, eu chegava derrubada em casa, era como se toda minha energia tivesse ficado no trabalho. Eu não conseguia fazer mais nada”, conta.
A atendente, que é advogada
requisitada do Ministério da Cultura, decidiu então fazer o caminho inverso.
Passou a filtrar melhor as emoções. Seguiu fazendo o trabalho que lhe cabia,
corretamente, mas mantinha-se um pouco mais distante daqueles que estavam
diante dela no balcão. Optou pelo equilíbrio. Hoje, ela tem empatia com os
assistidos, compadece-se com as histórias que ouve, mas já não leva os
problemas do trabalho para casa.
“Eu entendi que é muito difícil para uma pessoa que precisa ver seu caso
resolvido naquele momento ouvir que a solução pode demorar. Aprendi muito com
uma frase que ouvi da Defensora que dirige a nossa unidade aqui em Brasília:
nós (atendentes) temos a razão. Mas eles (os assistidos) têm a necessidade”,
resumiu Cristiane. “Temos que ter a capacidade de acolhimento para que aquela
realidade não fique tão pesada para nosso público”.
Chico Xavier e Psicologia
A Defensora Séfora Azevedo
Silva Zortéa é quem chefia a unidade da DPU em Brasília. Foi ela quem
disse para Cristiane a frase sobre necessidade e razão. Na verdade, não é uma
máxima dela. “Apesar de não ser espírita, gostei dessa frase dita por Chico
Xavier certa vez quando questionado como atender tantas pessoas que passavam
dificuldades sem perder a paciência e a serenidade”, contou a Defensora.
Ela busca, com auxílios de
psicólogos da equipe, passar aos atendentes a importância dessa postura mais
calma. “Sabemos que não é fácil, mas precisamos ter carinho, dar atenção, ter
empatia para entender que aquelas pessoas estão sofrendo e pedindo ajuda. O
atendimento, na maior parte das vezes, é a linha de frente para os assistidos”,
finalizou Séfora.